Pegadinha vertebral
O desequilíbrio entre os flexores e os extensores do quadril pode afetar negativamente as posturas de Yoga de muitas maneiras. Felizmente, uma prática consciente de alinhamento pélvico e lombar reduz esse desequilíbrio
Um quadril enrijecido e fraco pode tirar o alinhamento da coluna. O Yoga nos permite ter uma coluna saudável evitando dores e lesões.
Antagonista. Quando a maioria das pessoas escuta essa palavra, pensa em um oponente ou um adversário. Mas quando profissionais de saúde falam sobre músculos antagonistas, referem-se a uma relação muito mais complexa.
Embora músculos antagonistas controlem ações opostas, eles se unem para dar apoio a uma articulação do corpo. Pense nos músculos que flexionam o punho e os que o estendem. Quando fazemos parada de mão, ambos se contraem para ajudar a estabilizar o punho. Da mesma forma, o grupo de músculos antagonistas ao redor do calcanhar estabiliza a articulação quando executamos tadasana (postura da montanha) e outras posturas em pé.
Esse trabalho em grupo dos músculos antagonistas, chamado de cocontração, também é importante em dar sustentação à coluna, principalmente quando estamos em uma postura ereta. Idealmente, os músculos do tronco estão em equilíbrio, de forma que sustentem as curvaturas normais da coluna. Mas se um grupo de músculos sobrecarrega outro, podem aparecer dores e problemas posturais. Por exemplo, se os músculos abdominais sobrecarregam seus antagonistas — os paravertebrais (grupos de músculos paralelos que ficam ao lado das vértebras que são usados nas extensões) —, a musculatura abdominal deixará a coluna torácica curvada para a frente e a curvatura da lombar se retificará. Por outro lado, se os paravertebrais sobrecarregarem a musculatura abdominal, a curvatura lombar ficará acentuada (hiperlordose). Esses desequilíbrios podem levar a estiramentos em outros músculos, pressão nos discos intervertebrais e outros problemas.
Força motora
Os flexores e os extensores do quadril são também antagonistas que desempenham um papel fundamental no alinhamento da coluna. Esses músculos ajudam a controlar o giro da pelve, que forma a base para as curvas da coluna. Essas curvas afetam outras partes do esqueleto e o equilíbrio das ações musculares usadas na execução de vários movimentos.
Quando a parte anterior e superior da pelve desce enquanto os ísquios e o cóccix se elevam, a pelve gira anteriormente e vice-versa. Felizmente, a pelve possui pontos de referência que nos ajudam a entender para onde a pelve está girando. Esses pontos chamam-se espinhas ilíacas anterossuperiores (EIAS). Para encontrá-las, coloque os dedos indicadores sobre o umbigo e escorregue-os para as laterais do abdome, cerca de 5 cm abaixo. Se estiver sentado na beirada de uma cadeira, conseguirá sentir a EIAS girar para a frente em direção às coxas. Perceba que quando se inclina para a frente, a curvatura lombar aumenta, e, quando se inclina para trás, a curvatura tende a ficar reta.
Os extensores e flexores do quadril ajudam a controlar o giro da pelve fazendo-a girar por sobre as articulações do quadril. Os extensores do quadril se ligam à parte posterior da pelve e ajudam o quadril a mover-se de uma flexão a uma posição em que a coxa fique alinhada com o tronco. Os extensores do quadril também ajudam a girar a pelve para trás. A força motora desse movimento é dada pelos isquiotibiais, que se originam nas tuberosidades isquiais (geralmente conhecidas por ísquios, as tuberosidades formam a parte posterior inferior da pelve) e no glúteo máximo, que se origina na parte de trás da pelve e do sacro. O glúteo máximo se liga à lateral da parte superior da coxa e os isquiotibiais, à perna, logo abaixo do joelho. Ambos usam essas âncoras para empurrar a pelve para baixo.
A força motora na flexão do quadril é dada pelo psoas e pelo ilíaco. Eles são ajudados na flexão do quadril por vários outros músculos, principalmente o reto femoral.
Os flexores do quadril ficam em uma posição encurtada quando estamos sentados, e eles tendem a encurtar quando nunca nos alongamos para contrabalançar as longas horas que passamos sentados. Quando os flexores do quadril se tornam encurtados, o iliopsoas e o reto femoral continuam a empurrar a pelve e a lombar para a frente e para baixo mesmo quando estamos em pé. Esse movimento cria um giro pélvico anterior (anteversão), que contribui para aumentar a curvatura lombar.
Se os flexores e extensores do quadril estiverem em equilíbrio no que se refere à força e à flexibilidade, eles sustentarão a pelve em uma posição neutra, o que ajuda a manter as curvas naturais da coluna e mantém o peso da parte superior do corpo alinhado sobre o quadril quando nos sentamos e sobre as pernas quando estamos de pé. Se comparativamente os isquiotibiais estiverem encurtados e os flexores do quadril alongados, a pelve é puxada em um giro posterior (retroversão) e a curvatura lombar se retifica, o que propicia estiramentos nas costas e lesões nos discos intervertebrais. Por outro lado, se comparativamente os isquiotibiais estiverem alongados e os flexores do quadril, encurtados, o giro anterior propicia uma curvatura lombar acentuada e comprimida. Essa compressão causa desconforto a curto prazo além de um desgaste da cartilagem das articulações da coluna vertebral, o que pode levar à artrite.
Acabando com maus hábitos
Qualquer desequilíbrio entre os flexores e os extensores do quadril pode afetar negativamente as posturas de Yoga de muitas maneiras. Felizmente, uma prática consciente de alinhamento pélvico e lombar reduz esse desequilíbrio.
Tadasana (postura da montanha) é uma boa postura para melhorar o equilíbrio pélvico. Quando temos isquiotibiais encurtados, um giro pélvico posterior e uma tendência a retificar a lombar, precisamos relaxar os isquiotibiais e os glúteos durante a execução do asana; isso permitirá que o cóccix se eleve e se mova para trás. Empurrar as coxas para trás também ajuda a reduzir o direcionamento dos ísquios para baixo causado pelos extensores do quadril. Também precisamos relaxar a musculatura abdominal, deixando a respiração circular livremente nessa região. Todas essas ações ajudam a restabelecer a curvatura natural da lombar.
Quando tendemos a girar a pelve em um movimento posterior, precisamos nos conscientizar a evitar esse mau hábito para não termos problemas futuros ao fazer posturas que alonguem intensamente os isquiotibiais ou que exijam muita flexibilidade nessa musculatura. Nas flexões sentadas, por exemplo, isquiotibiais encurtados puxam os ísquios em direção aos joelhos, deixando a pelve em um giro posterior. Quando nos inclinamos para segurar nossos dedos dos pés, a inclinação parte da lombar, o que causa uma inversão de sua curvatura normal. Quando insistimos nesse movimento, ou o mantemos por longos períodos, podemos lesionar os músculos, ligamentos e discos da lombar.
Para evitar lesões nessas posturas, recomendo que a maior parte do alongamento nos isquiotibiais seja feita em asanas, que sejam [RDN1] fáceis de manter uma curvatura natural na lombar[RDN2] . Sugiro supta padangusthasana (postura deitada segurando o dedo do pé) e uma variação de utthita hasta padangusthasana (postura estendida com a mão no dedo do pé), deixando os pés apoiados em uma cadeira, prancha ou algum outro suporte. Em ambas as posturas, deixe a perna estendida em uma posição que ajude a manter um giro pélvico anterior suave e uma curvatura lombar natural. Isso significa não deixar o pé muito alto de forma a causar a pelve a girar posteriormente. A maioria dos praticantes com isquiotibiais encurtados deve iniciar com a altura dos pés não mais alta que o assento de uma cadeira. Na versão reclinada, mantenha os glúteos no chão e use uma toalha enrolada sob a parte de trás da cintura para manter a curvatura normal da lombar. Seja em pé ou sentado, gire o cóccix e os ísquios para trás, mantendo os joelhos estendidos.
Trabalhando diariamente nessas posturas, os isquiotibiais se tornam mais flexíveis, permitindo trabalhar as flexões sentadas sem comprometer a coluna lombar.
Se tiver isquiotibiais flexíveis e flexores do quadril encurtados, lembre-se de sempre incluir alongamentos nos flexores do quadril nas práticas. Isso pode ser conseguido com agachamentos, virabhadrasana I (postura do guerreiro I) e alongamentos dos quadríceps.
Se os isquiotibiais forem muito flexíveis, eles podem ser frágeis também, e o setu bandha sarvangasana (postura da ponte) é uma boa opção para fortalecê-los.
Quando usamos as posturas corretas, podemos corrigir desequilíbrios musculares entre os flexores e os extensores do quadril, prevenindo futuras lesões. O aprendizado sobre como equilibrar os músculos antagonistas no quadril nos permite também aprender a trabalhar em grupo, onde todos os lados trabalham juntos para o benefício do todo.
Julie Gudmestad é fisioterapeuta e professora de Iyengar Yoga em Portland, Oregon.
NOSSO CONSULTOR DIZ: Este artigo ressalta a importância de manterem-se equilibradas as condições de grupos musculares antagonistas no que diz respeito à força e à flexibilidade. Especialistas sabem que um dos desvios posturais mais comuns em nossa população é a hiperlordose lombar, caracterizada pela anteversão da pelve (aqui chamada de giro pélvico anterior), associada ao aumento da concavidade posterior na região lombar e frequentemente relacionada à síndrome cruzada inferior, que consiste no enfraquecimento de abdome e glúteos somado ao encurtamento de iliopsoas e quadrado lombar. Neste caso, alongar a musculatura lombar também se faz necessário. Boas posturas para alongar a lombar sem sobrecarregá-la são as flexões com pernas cruzadas (por exemplo, yogamudra). Acrescentando à própria sugestão da autora, defendo que o alongamento de iliopsoas é bastante eficaz quando feita a extensão unilateral do quadril associada à flexão contralateral e à manutenção do tronco verticalizado, neste caso bons exemplos são o hanumanasana, o anjaneyasana e o ashvanchalanasana. Um olhar atento às condições do quadril pode nos dar boas dicas de quais posturas selecionar.
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