Seu corpo


Por: Greice Costa

Será que o seu corpo está realmente funcionando como um meio para o seu bem-estar?


Você pratica para ganhar benefícios como quebrar condicionamentos, sentir-se melhor… E, muitas vezes, reforça padrões mentais e posturais inadequados para si. 
Se você faz asanas (posturas), qualquer que seja o método, pratica Hatha Yoga, em que se utiliza o corpo como ferramenta de libertação. Será que o seu corpo está realmente funcionando como um meio para o seu bem-estar?

Marcos Rojo
PhD em ciência do Yoga, é um dos mais importantes professores e conhecedores da área no país.

Como enxerga a prática física do Yoga? Podemos falar disso sem pensar no “pa­cote completo” do Yoga? Não é possível pensar apenas em corpo quando se fala em Yoga, assim como também não é possível se falar em mente, sem levar em conside­ração o corpo. Temos de levar em conside­ração o pacote completo: corpo, mente e alma. Yoga não é para o corpo, é atra­vés do corpo. Yoga não é para a men­te, é além da mente. Yoga é integração.


Existe uma evolução na prática de asa­nas? Ou eles se adaptam a nós como ao indiano de 3 mil anos atrás? Existe uma evolução na prática de asanas, justamente por se adaptar ao homem de acordo com o momento e suas necessidades. Asana é uma forma de se trabalhar com o corpo, é um conceito, é uma atitude, não é um desenho ou uma posição. Asana é “como” você faz e não “o que” você faz. Os textos mais antigos do Hatha Yoga praticamen­te descrevem posturas de meditação. Os mais recentes já apresentam diversas posturas, percebendo as necessidades do homem para se manter sentado por um longo tempo, para poder fazer pranaya­mas e meditação.


De um modo geral, o que você pode contar sobre o corpo dos alunos que praticam as modalidades de Yoga mais populares e vigorosas da nossa época? Algumas modalidades mais dinâmicas ou exigentes (fisicamente) em Yoga definem bem o corpo, cuidam da aquisição de habi­lidades e capacidades físicas, mas oferecem riscos. Muitos praticantes têm machucado seus joelhos e coluna por tentarem fazer coisas que o corpo ainda não está prepa­rado. Assim também foi com a ginástica aeróbica, por exemplo: logo depois de sua criação, lançaram a ginástica aeróbica de baixo impacto, pois estava machucando o joelho de muita gente. O grande desafio no Yoga não é com o corpo, mas com a mente.
Os principais cuidados com a prática mais forte devem ser com joelhos e coluna.


Como o praticante pode ganhar benefí­cios do Yoga sem se lesionar? É só se­guir o conselho do grande sábio do Yoga, Patañjali. O asana deve ser estável e con­fortável. É firme e ao mesmo tempo agradável. Não-violência é o primeiro passo no Yoga. A superação de limites é importante para outras disciplinas de trabalho com o corpo. Qualquer tipo de treinamento, quando bem-feito, vai ajudar o praticante de Yoga e vice-versa. Apenas tenha o cuidado de quando es­tiver fazendo Yoga, faça Yoga e quando estiver fazendo ginástica, faça ginástica.


Por que muitas pessoas com tendên­cia à hipermobilidade são justamente as que se apaixonam por Yoga? Pesso­as com hipermobilidade têm facilidade nos asanas, pois a maioria deles trabalha com alongamento. Por outro lado, os que mais precisam não gostam muito no início. Desta forma, costumo dizer que temos de ser motivados à prática dos asanas pelo prazer e pela necessidade. A hipermobilidade pode levar o pratican­te de exercícios de alongamento muito próximo do limite de sua articulação, o que numa situação mais extrema é um risco. Para estes que têm hipermobilida­de é recomendável trabalhar com forta­lecimento e um pouco de musculação.
www.marcosrojo.com.br



Pedro Bara Zanotto 
Graduado em Esporte pela USP, ele ensina um método próprio de Yoga que de maneira interessante incorpora princípios biomecânicos à prática dos asanas.

Como você chegou ao formato da sua aula atual?
 Pratiquei alguns métodos de Hatha Yoga, mas a formação mais duradoura foi do método Iyengar. Após alguns anos de prática, senti algumas ve­zes dor na coluna e algumas nos joelhos, mas isso não foi decisivo para mudar para exercícios mais “funcionais”. Em 2010 fiz um curso de formação em dor no CEDM (www.centrodeestudosdador.com.br). Este curso trouxe uma visão mais integrada, que olhava não somente para as ações, sensações ou efeitos que os asanas promoviam. No curso vimos que é preciso compreender como nosso corpo funciona e assim adequar a prática.
Digo isso por que acredito que exista uma verdadeira crise em algumas meto­dologias, escolas e pensamentos. A ori­ gem desta crise é a dificuldade de incor­porar multidisciplinaridade e transdisci­plinaridade aos métodos. Tal dificulda­de, apesar de não impedir, acaba isolando o conhecimento de cada metodologia e freia o processo de integração. Muitas vezes os métodos não conversam entre si.  No Yoga, por exemplo, nos preocupa­mos bastante com os efeitos das postu­ras. Mas efeitos onde? No cérebro? Nos órgãos? Nas articulações? Enquanto não soubermos responder, corremos riscos de promover efeitos que não queremos.  


 Como são suas aulas? Ainda tenho bastante influência de Iyengar, espe­cialmente por considerar a importância do relaxamento e de posturas “restau­rativas”. Mas a prática corporal ativa é bem diferente. Pratico e trago para as aulas o conceito de promover estabilida­de articular: não indico as posturas que vão além dos limites articulares. Incluí no repertório exercícios que promovam fortalecimento de músculos posturais e ganho de estabilidade em articulações que tendem para ou que sofrem com ex­cesso de mobilidade. Quando identifico alunos com importantes encurtamentos musculares, trabalhamos para ganhos de amplitude, e o repertório é mais parecido com o do Iyengar. Não acho que misturo técnicas, mas alguns alunos comentam que parece treinamento funcional, ou pi­lates. Tento colar o que sei de fisiologia com recursos do meu repertório.


Existe uma evolução na prática de asa­nas? Ou eles se adaptam a nós como ao indiano de 3 mil anos atrás? Como sou otimista acho que existe evolução em tudo. Vivemos uma era de facilida­de para a troca de informações. O Yoga recebe e transfere influência o tempo todo e isso aumenta as possibilidades de evolução. E evolução não é só tornar-se mais inteligente, belo, forte ou rápido. Evolução é essencialmente tornar-se mais apto. O homem de hoje tem pro­blemas diferentes do indiano de 3 mil anos atrás. Seu corpo é hoje mais “des­cansado” (por ser mais sedentário) e seu cérebro é mais ativo (por estar conecta­do com informações e estímulos). Neste contexto o Yoga é uma ferramenta útil que possibilita minutos de tranquilida­de no cotidiano. Quando falamos de evolução, não podemos deixar de lado o conceito de seleção. Então, é bom para a evolução que exista diversidade de mé­todos, de abordagens.


Como enxerga a prática física do Yoga? Vejo na prática dos asanas muitos be­nefícios para indivíduos encurtados. O problema está no momento que o encur­tamento desaparece e notamos ganhos na amplitude articular. Alguns músculos estabilizadores também podem ser croni­camente alongados. Quando estes tecidos diminuem a contenção e a postura envol­ve muita flexibilidade, corremos o risco de alongar ligamentos e a própria cápsula articular. Esta condição, quando repetida cronicamente, pode gerar degeneração precoce em algumas articulações.
Para entender isso é importante res­saltar que encurtamento muscular e ri­gidez muscular são conceitos diferentes. Quando um professor comenta que tem um aluno muito “duro”, está confundin­do conceitos: ele quer dizer que o alu­no é encurtado e não rígido. O encur­tamento implica em não ter a total ou desejada amplitude de movimento. É tamanho. A rigidez não é a amplitude ou comprimento e, sim, a resistência. Enquanto o encurtamento é ruim, pois altera nosso padrão de movimento e nos deixa “não funcionais”, a rigidez é boa, pois garante estabilidade e integridade. A rigidez possibilita economia de ener­gia. A correta ação muscular estabiliza­dora contribui para aumentar a rigidez.


Como o praticante ganha benefícios do Yoga sem se lesionar? Justamente co­lando os conhecimentos tradicionais do Yoga com o que a fisiologia nos diz. Não basta estimular no aluno uma prática suave ou não competitiva. Isso tem seu valor, mas para prevenir lesões é preciso adequar os asanas à fisiologia. 
Outra opção é que o aluno comple­mente a sua prática de Yoga com um trabalho de reforço da estabilidade.
www.centroiyengar.com.br



Uma visão abrangente
Rodrigo Espanhol e Daniel Gonçalves comandam o centro Articular, em São Paulo, espaço de treino e cura para atletas, ex-sedentários, acrobatas, surfistas e praticantes de Yoga.

O que é treinamento integrado?
 Ro­drigo Espanhol Consiste no trabalho consciente das estruturas corporais, respeitando os princípios da hierarquia estrutural segmentar. O nosso trabalho não se resume a uma técnica e, sim, a um conceito de trabalho corporal, aber­to à utilização de diversas técnicas com intuito de suprir as necessidades do in­divíduo na organização segmentar e glo­bal das estruturas corporais.


Qual o contato de vocês com Yoga? RE Hoje tenho minha prática de Iyengar Yoga com a professora Marina Athanas e já faz algum tempo que venho recebendo no Centro Articular diversos praticantes e professores de Yoga para a realização de um trabalho complementar no diag­nóstico, prevenção e tratamento das alte­rações músculo-esqueléticas. Observo o Yoga de forma muito respeitosa por toda sua filosofia e tradição. Observo também que diversas técnicas de trabalho corpo­ral foram e são baseadas em estruturas e posturas originais do Yoga. Por esse mo­tivo, aqueles que encaram o Yoga apenas como uma prática física ou uma forma de treinamento podem não se beneficiar de acordo com suas expectativas, além de de­senvolverem lesões por não respeitarem as estruturas do corpo, pois nem todos possuem as características fisiológicas e biomecânicas para atingir certo grau de evolução nas posturas.


O que vocês podem contar sobre o cor­po dos alunos que praticam as moda­lidades mais populares e vigorosas de Yoga? RE Em minha experiência clíni­ ca, diversos foram os casos de praticantes assíduos de Yoga com lesões ou desarmo­nias na organização corporal. Entre eles posso citar as que mais vejo acometer esses praticantes: lesão de impacto no ombro (tendinose do supra espinhoso), lesão de punho causada por uso excessivo de apoios e até fraturas, protusões e hér­nias discais, principalmente nas regiões cervical e lombar, lesões de menisco me­dial devido à grande compressão na pos­tura de lótus e quadros de instabilidade articular devido ao desenvolvimento de frouxidão dos estabilizadores passivos.
Daniel Gonçalves Muitas vezes, os alunos que praticam Yoga chegam para treinar com uma hipermobilidade arti­cular – uma mobilidade maior do que a necessária para as articulações funcio­narem normalmente. Isso pode causar uma falta de estabilidade nas principais articulações, desencadeando dores e desconfortos, principalmente na coluna.
Como o praticante ganha benefícios do Yoga sem lesionar o corpo? E como o treinamento integrado age nesse con­texto? RE Em primeiro lugar, deve-se deixar o ego de lado e respeitar seus próprios limites, estudar e compreender melhor a filosofia do Yoga. O treina­mento integrado pode auxiliar de forma a permitir que o praticante reco­nheça suas estruturas anatômicas e a forma que elas relacionam-se entre si, diferenciando amplitude de movimento de alongamento e, mais importante, auxiliar essas pesso­as a atingirem seus reais objetivos, pois como diz um de meus mestres: “Se quer parar de sentir dor de cabeça, pare de bater com a cabeça na parede”.
DG O treinamento integrado tem como objetivo dar estrutura para as prin­cipais articulações e fortalecer muscula­turas profundas que são responsáveis pela manutenção de um corpo estruturado.
Rodrigo Espanhol é educador físico especializado quiropraxia, terapia manual e medicina tradicional chinesa, com pós-graduações em treinamento desportivo e biomecânica e traumatologia. Daniel Gonçalves é educador físico pós-graduado em fisiologia do exercício e em bases fisiológicas e metabólicas aplicadas a nutrição e atividade física. www.centroarticular.com.br

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