Da expectativa
Expectativa: esperança, baseada em supostos direitos, probabilidades ou promessas; algo que se espera.
Quando nos programamos para fazer alguma coisa, inevitavelmente, surge uma expectativa. No caso de uma viagem, a respeito do lugar, das pessoas que vamos conhecer, da comida, dos hábitos. No trabalho, esperamos ser reconhecidos, remunerados, respeitados.
Ao praticar ásanas, espero um corpo saudável que me permita vivenciar minha sadhana da melhor maneira possível.
Quem escreve, espera ser lido...
Quando começamos uma relação amorosa, por mais que digamos que não esperamos nada da outra pessoa, no fundo esperamos que dê certo. Do contrário, ficaríamos sozinhos. Enfim, quando buscamos algo, queremos encontrar...
Isso também acontece em relação aos nossos estudos, às diversas formações pelas quais passamos e aos mestres que vamos encontrando pelo caminho.
Esperamos encontrar nos mestres as respostas de nossos enigmas quando, na verdade, eles, os enigmas, fazem parte do nosso desenvolvimento e de mais ninguém. Os mestres também estão em busca da solução dos seus enigmas. Queremos deles atenção, tempo, dedicação, mas eles também tem seus mestres e também querem tempo e atenção.
Cobramos coerência, retidão, e generosidade, mas às vezes esquecemos que eles também são humanos, lutando desesperadamente para não se deixarem levar pelo ego que insiste em querer dominar.
Ao escolhermos um mestre, devemos ter claro que ele não está ali para nos pegar pela mão e conduzir em direção a iluminação. Ele pode nos indicar o caminho, mas as estradas que tomamos, cabe apenas a nós, escolher.
Na Bhagavad Gita, Krishna nos ensina que: “Obtem-se a paz quando todos os desejos dissipam-se dentro da mente sem criar qualquer distúrbio mental, como as águas de um rio entram no oceano sem causar qualquer distúrbio”
Assim, quando nos depararmos com pessoas, pelas quais sentimos admiração, devemos ser como a abelha que tira de cada flor o necessário para fazer o seu mel. Devemos absorver de cada mestre que encontramos a sua experiência, mas tendo a sabedoria de não esperar que a nossa jornada seja igual a dele.
Esperar que o professor nos guie pelos caminhos que ele percorreu, necessariamente levará a frustrações. Na relação com um mestre, é preciso ser tábula rasa, não idolatrar, e nem esperar que ele tenha por você a mesma admiração que você tem por ele.
Afinal, não foi ele que te escolheu. Foi você quem o procurou. No entanto, não devemos confundir desapego com indiferença. O verdadeiro mestre distribui seu conhecimento sem distinções, sem esperar nada em troca. Ele dá porque esta é a sua missão. Ele sabe que deve ensinar como retribuição ao que aprendeu com seus próprios mestres. Como disse meu professor: conhecimento guardado é estrume!!!
De nada adianta criarmos métodos, escrevermos livros, se não exercitamos o conhecimento na prática. O estudo serve para chegarmos ao auto conhecimento, mas a erudição por si só não leva ninguém à iluminação.
É preciso compartilhar, não apenas com os iguais, mas principalmente, com os que discordam de nós. A erudição é uma faca de dois gumes. É preciso ter muito cuidado para não nos acharmos melhor do que os outros, nem nos fecharmos em pequenos grupos de “iguais”, porque assim, vamos contra a essência do yoga que é a união e a expansão.
Yoga não é um conhecimento para ficar trancado em guetos e sim para ser vivido em todas as horas e lugares e por todas as pessoas.
É muito fácil ficarmos trancados em nossos deliciosos retiros e cursos que enchem nossa alma de sentido e certezas. O duro é ser yogi onde ninguém é... Onde a gente se sente um alienígena. Todos aqueles que estamos na busca de quem somos, já somos mestres, apenas ainda não sabemos...
Intuimos que a vida tem um sentido muito maior do que as funções que nosso ego cumpre, mas ainda temos um véu que insiste em não nos deixar ver. Para isso, buscamos nossos mestres. Para que eles nos ajudem a tirar o véu.
Portanto, ao se deparar com um mestre que deposite em você expectativas e cobranças, tenha compaixão. Entenda que ele é tão passível de falibilidade quanto você. Apenas está alguns kilômetros à sua frente. Ou metros...
Levei muito tempo pra entender o que nenhum mestre vai me ensinar: que aquilo que eu insisto em procurar nos livros e nas aulas, está dentro de mim. Preciso apenas parar de ter medo de procurar...
Na Bhagavad Purana, Krishna diz:” você deve ser um jardineiro de Deus, administrando cuidadosamente o jardim, mas jamais se tornando apegado por aquilo que irá florir ou brotar; que irá dar frutos ou que irá murchar e morrer. A expectativa é a mãe da frustração e o aceitar, nos dá paz.”
Assim, agradeço aos mestres que me acolheram, assim como àqueles que me frustraram. Talvez tenha sido com estes que eu mais tenha aprendido...Namaste!
Tereza é yogini, atriz, locutora, escritora, historiadora e professora de Yoga; mora, pratica e ensina em São Paulo. Dirigiu e produziu, em parceria com Daisy Rocha, o documentário Caminhos do Yoga, filmado na Índia em 2003.
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